Imortalidade
Quando ocorrem tempestades, descubro
Que já não tenho os medos de menino;
São outros agora os assombros dos dias
Quer sejam intensos, quer sejam vazios.
Percebo não sem agonia que meu ofício
De escrever me causa profunda depressão;
É quando compreendo o que há em mim
Que pulsa, magoa cada nervo, rasga
Sob a pele da alma o incompreensível fado.
Quando o sol se põe a escuridão se revela
Mas já não tenho medo de seu ingênuo espanto
Que das trevas que de mim se apossam
Surgem assombrações que jamais se apavoram.
É quando descubro que meu ofício de escrever
Se fortalece das fundas e depressivas cavernas;
Eu compreendo o que há em mim e no mundo
Que gira em torno das sempre renovadas dores.
Sem perplexidade ou pressa descubro a vida
E sua insanidade; e que a loucura dos homens
Não é mero efeito de rumos e perturbações acidentais.
Sem sustos, percebo que o mal é constante como a luz
E que oito bilhões de errantes alimentam sua força.
Descubro que, para além da incrível ignorância,
A pretensão da verdade é o grande e fatal inimigo.
E antecipo teu riso por essa tão tola ingenuidade
(Tantas décadas e apenas agora me apercebo?)
Mas as esferas do ser, interpostas e concêntricas
Aniquilam a vaidosa pretensão de completude;
A vida humana é complexidade vazia, sem verdades
Além daqueles moldadas em subjetivos laboratórios.