Eça de Queirós foi um dos mais brilhantes romancistas da língua portuguesa e o grande renovador da ficção em Portugal no século XIX. Com estilo elegante, ironia precisa e crítica social contundente, Eça transformou o romance realista em instrumento de reflexão sobre a sociedade, a moral e as ilusões humanas.
Em livros como O Primo Basílio, O Crime do Padre Amaro e Os Maias, sua obra-prima, ele expôs hipocrisias, ambições e paixões com uma lucidez rara. Nada escapava ao seu olhar: a política, a igreja, a família burguesa, os costumes do país — tudo era material para seu humor afiado e sua narrativa envolvente.
Eça escreveu com a leveza de quem observa o mundo e a força de quem deseja transformá-lo. Ler Eça é entrar numa prosa luminosa, inteligente e sempre atual.
Leia um trecho:
“Leopoldina tinha então vinte e sete anos. Não era alta,
mas passava por ser a mulher mais bem-feita de Lisboa.
Usava sempre os vestidos muito colados, com uma
justeza que acusava, modelava o corpo como uma
pelica, sem largueza de roda, apanhados atrás. Dizia-se
dela com os olhos em alvo: é uma estátua, é uma Vênus!
Tinha ombros de modelo, duma redondeza descaída e
cheia: sentia-se nos seus selos, mesmo através do
corpete, o desenho rijo e harmonioso de duas belas
metades de limão; a linha dos quadris rica e firme, certos
quebrados vibrantes de cintura faziam voltar os olhares
acesos dos homens. A cara era um pouco grosseira; as
asas do nariz tinham uma dilatação carnuda; na pele,
muito tina, dum trigueiro quente e corado, havia
sinaizinhos desvanecidos de antigas bexigas. A sua
beleza eram os olhos, duma negrura intensa, afogados
num fluido, muito quebrados, com grandes pestanas.”
(O Primo Basílio)
